Recordo-me de quando muito jovem/menino ouvir
os relatos de futebol. Os meus pais não tinham tv. Nem luz, quanto mais tv. Havia um candeeiro a petróleo. Naquele tempo era
um privilégio ter tv.
Não sei se alguma vez pensei no que queria ser, ou do que iria gostar pela vida fora. Andava na escola com mais cerca de 30 alunos, desde a 1ª à 4ª classe. Todos juntos.
Um fato sempre soube. É que dentro do
meu coração, ao ouvir os relatos de todos os clubes, nascia uma
PAIXÂO quase doentia pelo Benfica.
Um dia com 25 tostões no bolso,
nem sei como os arranjei, vim, a correr desde o Campo de Tiro de
Alcochete, onde nasci e residia, até Alcochete, ( cerca de 10
quilómetros) onde apanhei o barco para Lisboa. Tinha os meus 10
anos. Chegado ao Terreiro do Paço, após sair do barco, sempre a pé
e perguntando aqui e ali, cheguei ao Estádio da Luz, talvez pelo
meio-dia, UMA HORA da tarde.
Não sabia o que era isso numa questão
física. Mas sei que a minha felicidade era maior que, já adulto,
fiz sexo pela 1ª vez. E, como devem imaginar, fazer sexo pela 1ª
vez é o momento, talvez mais alto e determinante na vida de todo o
homem e toda a mulher. Passei um dia de muita fome. “roubei” um
cacho de uvas numa frutaria, algures em Lisboa. O dono aos gritos
correu atrás de mim. Claro que não me apanhou. Só vi o Estádio da
Luz por fora.
Sem saber bem como, mas correndo pelas
ruas de Lisboa, apanhei o barco das 17:00 para Alcochete
Cheguei a minha casa, cerca das 21H00.
Já era noite. O meu pai esperava-me à porta com um cinto na mão.
Eu que havia corrido de Alcochete até casa estava exausto. Ouvi
perguntar? Onde estiveste. Eu nem conseguia falar, mas consegui
sentir. Levei várias cinturadas. A minha querida mãe também levou
uma ou duas por se meter entre mim e o meu pai. A minha mãe levou-me
para a cama chorando. Mas eu não chorei. O meu coração estava
cheio da visão de ter visto o Estádio da Luz. Sabia que lá dentro
jogavam Eusébio, Torres, Simões, Cavém, Camolas, Coluna, José Augusto,
Costa Pereira e tantos outros que eram os meus heróis. Éramos cinco
irmãos. Hoje somos quatro vivos.
No outro dia só vi o meu pai ao
jantar. Estava calor. Eu estava sem camisa e nas costas tinha os
vergões das cinturadas. Não me cheguei à mesa. O meu pai
chamou-.me, perguntando-me. Onde foste ontem para deixares os teus
irmãos sozinhos, que não comeram todo o dia? A minha irmã mais nova ainda bebé estava no campo
junto do trabalho da minha mãe. Não respondi: Voltou o meu pai,
fazendo um gesto de que me ia voltar a bater. Onde foste? Confesso que a minha alegria em ir ver o Estádio da Luz era tão grande que nem me lembrei que os meus pequenos irmãos - eu sou o mais velho - ficavam sozinhos o dia todo. Coisas de criança.
Respondi, admito que
por má educação: O PAI pode bater-me. Pode-me até MATAR com as
suas cinturadas, mas do meu coração, JAMAIS CONSEGUIRÁ APAGAR o
que ontem senti de ALEGRIA E FELICIDADE, ao sentar-me numa pedra e
OLHAR para o Estádio da Luz, lá em Lisboa. Essa imagem o PAI nunca apagará.
SIM,
pensei que era o meu fim. A minha ousadia, coragem, quiçá má educação, poderia ter-me custado caro. Não foi, nem me custou caro. Antes pelo contrário.
O meu pai ficou em silêncio. Não me perguntou como é que eu tinha vindo até Lisboa, se sozinho, e/ou com que dinheiro, ou com quem.
O meu Pai – que está vivo dentro do
meu coração – levantou-se da mesa, jantar no prato – (bacalhau cozido, batatas, cenouras e grelos de couve - legumes da nossa horta, meu Deus como me lembro) - temi o pior e a minha mãe
também – e saiu para a rua.
Eu a tremer, não conseguindo jantar,
ao fim de algum tempo, sai também para a rua. Não sei a razão. Talvez com medo do regresso do meu pai. Morávamos no campo. Na rua, vi o meu pai sentado a
uns 30 metros. A noite estava clara. Cheio de medo, fui até junto dele. O meu Pai chorava copiosamente. Ele também era benfiquista. Puxou-me até ele, num abraço que ainda hoje sinto, disse:
FILHO DESCULPA.
As suas lágrimas escorriam pelas minhas costas. pois eu estava em tronco nu. Eram lágrimas de AMOR. Não tenho dúvidas disso. Anos mais tarde - eu já adulto - falámos os dois nisto. Ficámos ambos a chorar num forte abraço.
Acabada a 4ª classe o meu pai
trouxe-me para a zona de Lisboa – Ponte de Frielas – onde moravam
amigos da terra dele e que eu sempre considerei como família. Fiquei
a trabalhar num café.
Sabem o que fiz um dia ou dois depois? Tirei
dois escudos da caixa registadora – que Deus me perdoe – e fui
ver o Estádio da Luz. Meu Santo Deus. Que FELICIDADE.
O primeiro jogo que vi no Estádio da
Luz. Benfica vs Sporting. Ganhou o Benfica 1-0. Já não me recordo
de quem marcou o golo. Foi o êxtase total.
AGORA DIGAM-ME: Como não AMAR (E SOFRER) o/pelo BENFICA?
Para mim o BENFICA está acima de todas as coisas, exceto a família (e não é toda) 😁😁😁 ?
BENFICA SEMPRE ATÉ APÓS A MORTE
.
Passei literalmente pelo mesmo, mas fui criado pelo meu avô que era um sportinguista doente, pediu desculpa e respeitou sempre o amor que sozinho criei pelo Benfica.
ResponderEliminarPoison
EliminarSão histórias verdadeiras de vida
Grande abraço
Benfica Sempre
Epa, aqui a fazer um homem adulto :¨(
ResponderEliminarAbraço glorioso
EliminarCaro Ryk@rdo um post de uma história de vida emocionante e apaixonante, fiquei comovido com os detalhes e com o seu amor ao Benfica, grande abraço...
ResponderEliminarRui Dourado
EliminarSim, o meu amor ao Benfica tão alto como as estrelas que brilham no Céu
Retribuo o abraço
Ryk@rdo amigo a tua historia e comovente tocou-me no coraçao o teu benfiquismo aquele menino que se sentio feliz so por ver o estadio por fora com aqueles craques todos la dentro, depois bem depois trabalhou o cinto tambem apanhei algumas nao muito, hoje que falta faz uma chibatas na juventude de agora fazia-lhes bem mas os tempos sao outros se lhes tocamos temos a policia a porta violencia domestica ou child abuse,e nao foi por essas cintadas que os deixamos de amar havia respeito havia amor hoje isso quase nao existe, o Benfica te fez passar por isso mas nao deixo de dar razao ao teu falecido pai porque de Alcochete a Luz ainda e um percurso longo e para um jovem como tu metido numa aventura dessas olha trabalhou o cinto podia ter sido mais leve mas o teu pai perdeu o controlo arriscas-te demasiado.
ResponderEliminarRyk@rdo eu fiz esse trajecto mais ou menos igual ao teu, desde o Montijo so que era jovem militar atravessei o tejo ate ao estadio nacional para ver um Benfica Academica aquela celebre final de taça de Portugal em 1969 em que o Benfica ganhou 2-1 com golos de Simoes e Eusebio so que ja era mais crescidinho que tu e nao houve cinto era um militar a caminho de Africa tambem era o que mais faltava lol.
Ryk@rdo bem hajas pelo teu grande benfiquismo pelo Benfica nos sacrificamos a tudo vale a pena ser-se do Benfica mesmo apanhando umas chicotadas.
Um grande abraço
Francisco.
EliminarTu e a tua esposa são da minha família. Não de sangue mas de coração. Sabes isso
O meu pai fez de três filhos e duas filhas, pessoas de bem e de grande respeito. Sabes qual foi uma das minhas mais amadas profissões durante mais de 30 anos. Infelizmente um dos meus irmãos já faleceu. Morte causada por essa terrível doença (cancro nos pulmões)
Grato pelas tuas palavras amigas
Grande abraço e, aqui de casa, beijinhos à tua ilustre esposa.
Durante cerca de 15 anos NÃO FALTEI a um único jogo no Estádio da Luz. ( no antigo e no novo) Agora sou mais de sofá, lol. O meu coração já não aguenta certas emoções. Já uma vez - em 2011 -, me falhou. Espero que não volte a falhar tão depressa. Agora se morrer pela emoção, morro deitado no sofá, 😁😁😁
BENFICA SEMPRE, SEMPRE, SEMPRE
Ryk@rdo que honra ouvir isso de ti obrigado pelo teu carinho, e verdade embora nao nos una laços de sangue, mas nos une laços de uma amizade sincera e duradora que foi construida ao longo dos anos tudo de bom ai para voçes cuida-te o Benfica e muito nas nossas vidas mas nao e tudo mas foi graças ao Benfica que nos conhecemos , minha esposa retribui os beijinhos para ti e familia um dia destes liga para voces para pormos a converça em dia um grande abraço saudinha.
EliminarSou contra toda a violência tanto infantil como outra qualquer.
ResponderEliminarMas compreendo o teu pai foram cinturadas por amor , o medo que tivesse acontecido uma desgraça .
O meu amor pelo Benfica também é inabalável .
Minda
EliminarEm adulto, o meu pai puxou dessa e outras situações menos boas praticadas por ele para comigo. Não falou das praticadas por mim para com ele que também as houve. Abraçado a mim, pediu-me desculpa, frisando no entanto, que eu era uma criança rebelde e que o ter chegado a casa pelas 6 horas da tarde e encontrado os meus irmãos sujos, com fome, e sem a minha presença, o deixou fora de si. Hoje, sou marido, pai e avô. Como eu hoje compreendo o meu pai. Podia não me ter batido com o cinto? Sim, podia. Mas, se calhar, para a minha orientação futura, como homem, não seria a mesma coisa e..............VIVA O NOSSO ENORME BENFICA.
Ric
EliminarEu compreendi as razões do teu pai , eu também tive muitas lições de vida 😃 fui o que se chama uma criança difícil e fazer asneiras era o meu hobby 😃😃.
Bom-dia Ricardo,
ResponderEliminarQue partilha maravilhosa!
Sao vivências que deixam em nós marcas indeléveis e que, sem dúvida, sustentam, não raras vezes, o nosso caminho.
Caríssimo amigo Ricardo,
ResponderEliminarBenfiquista que É BENFIQUISTA, sofre, mas sabe sofrer.
Partilha comovente de uma lição prà vida.
RETALHOS DA VIDA DE UM BENFIQUISTA.
Grande abraço.